De que Educação Ambiental estamos falando?
Em um mundo extremamente complexo, atravessado por uma diversidade de projetos de sociedade, precisamos sempre evidenciar a serviço de que projeto de sociedade e MUNDO mundo estamos, assim como de que Educação Ambiental estamos falando, já que há muitas, distintas e legítimas concepções compartilhando um mesmo campo. Nosso objetivo é contribuir com a formação de Educadores. Formação como um processo em construção, comprometido com tudo o que nos faz pensar melhor, com tudo o que nos faz pensar sobre o nosso próprio pensamento, com concepções filosóficas de base, que nos ajudem a entender que o que está em questão quando falamos de Educação Ambiental não é apenas a proposição de novas práticas mas, sobretudo, de novas lógicas e maneiras de ser e de habitar o mundo. Há alguns campos do saber em que a proposição de práticas não implica necessariamente a aquisição de novas lógicas e novas posturas, e de um redimensionamento do ser humano diante da vida. A Educação Ambiental implica não apenas um novo modo de pensar e de agir, mas também um novo modo de conceber o ser humano no entrelaçamento de todas as questões. Isso não se consegue sem reflexão, sem formação, sem o envolvimento do sujeito do conhecimento no próprio processo do conhecimento. No artigo intitulado ‘O “complexo Deus” moderno’, desta semana, Leonardo Boff nos pergunta: “Que poder temos sobre a natureza? Quem domina um tsunami? Quem controla o vulcão chileno Puyehe? Quem freia a fúria das enchentes nas cidades serranas do Rio? Quem impede o efeito letal das partículas atômicas do urânio, do césio e de outras liberadas, pelas catástrofes de Chernobyl e de Fukushima?” A pertinência de tais perguntas nos adverte que podemos “mitigar” os impactos da ação antrópica no mundo, mas não dominar a força da vida. As tecnologias associadas a novas lógicas e a serviço de um projeto de Vida têm sentido. Mas não nos iludamos em relação às mudanças em nós mesmos que precisaremos operar. São mudanças dolorosas, inevitáveis. Por isso é tempo de pensar as nossas premissas!
Boletim No. 2, Ano I
Educação Ambiental: por uma diversidade de saberes
No último Informativo,propusemos uma das premissas da Educação Ambiental como uma nova forma de se elaborar o conhecimento e os saberes, levando em conta as relações entre tudo o que existe. Hoje trazemos outra premissa, complementar à primeira: o reconhecimento da diversidade de formas de conhecer, de pensar e de fazer como expressão legítima de uma Educação Ambiental. Historicamente, com o advento da ciência moderna, um método científico de conhecer, aliado a um modo racional de se construir o conhecimento, ambos circunscritos no espaço formal da Escola e da Universidade, tornaram-se formas hegemônicas de consolidar o conhecimento. Isso nos fez acreditar que a racionalidade humana responde por todas as dimensões do ser humano, e que a ciência responde por todas as formas de conhecimento. Tal reducionismo contribui também para a crise ecológica . Ainda que reconheçamos a importância da ciência moderna e nem mais consigamos imaginar como seria viver sem tudo o que ela nos proporciona, precisamos resgatar a força dos saberes que foram invisibilizados pela modernidade e que equilibram o mundo
Em termos de preservação da biodiversidade, de nada serve a ciência moderna, e sim os conhecimentos
indígenas e camponeses, cujas áreas têm um índice de 80% da biodiversidade (Santos)
Boa ventura de Sousa Santos, em seu livro Epistemologias do Sul (2007, p. 33) fala-nos que é indubitável a importância do conhecimento científico para levar o ser humano à Lua. Mas nos chama a atenção que em termos de preservação da biodiversidade, de nada serve a ciência moderna, e sim os conhecimentos indígenas e camponeses, cujas áreas têm um índice de 80% da biodiversidade. E conclui dizendo que se queremos ambas as aquisições, precisamos das duas formas de conhecimento. Outro exemplo interessante nos traz Marina Silva, narrada em sua biografia, no livro “Marina: a vida por uma causa” de Marília de Camargo César (2010, p. 104), quando fala dos saberes caboclos que não falham, como, por exemplo, a previsão de chuva: para além da certeza meteorológica dos técnicos, o caboclo da Amazônia sabe que quando as formigas às margens do rio passam do formigueiro abaixo para o de cima, é certa a chuva que faz subir o leito dos rios. Tal conhecimento é complexo e rico, porque faz parte da interação entre o ser humano e natureza, consolidada ao longo dos anos. Na perspectiva da diversidade das formas de conhecer, para além da racionalidade, e para além da ciência moderna, a Educação Ambiental precisa estar atenta às múltiplas dimensões humanas – a sensibilidade, a emoção, a espiritualidade, a experiência -, e às múltiplas formas de diálogo entre o ser humano e a vida que, para Maturana e Varela, constituem o próprio ato de aprender. Paulo Freire, ao se referir à leitura do mundo como uma aquisição que
precede à leitura da palavra, em sua memória poética, evidencia-nos que as relações de conhecimento entre nós e o mundo vão se dando através de relações com multiplicidades infinitas de visões, formas, de sons, de movimentos, de cheiros, de toques, e cores, de estações, de elementos da natureza, de humores. Precisamos apostar numa Educação Ambiental comprometida com a diversidade de dimensões humanas e com a diversidade epistemológica do mundo. Como nos diz Santos, não é possível uma justiça social global sem uma justiça cognitiva global. Eu acrescentaria: Não é possível uma justiça ecológica global sem uma justiça cognitiva global, ou seja, sem uma inclusão dos múltiplos saberes e sujeitos que os produzem, não apenas na Academia, mas também no drama diário da existência.
Por uma Eco-espiritualidade
Sugestões de Atividades:
Aprendendo a permanecer no momento presente em um ambiente harmonizado, com as cadeiras em círculo, o educador, após fazer algumas respirações com os participantes, motiva-os para um exercício a ser feito em silêncio. Mostra uma caixa aberta, que representa o PASSADO, ou seja, todos os pensamentos e memórias que, embora já tenham acontecido, normalmente atraem o nosso pensamento e nos impedem de permanecer no presente. Cada participante recebe a caixa de seu vizinho e, num gesto simbólico, deposita nela tal memória passada. Após a caixa retornar ao educador, uma nova caixa apresentada,agora representando FUTURO, ou seja, todos nos nossos projetos ou questões que nos geram ansiedade e desconcentração. Da mesma forma, cada participante recebe a caixa e, num gesto simbólico, deposita tal pensamento. Enquanto cada participante faz seu gesto, todo grupo permanece em silêncio. Ao final, o educador retoma as duas caixas, fecha-as e coloca-as ao centro. Neste momento ele busca sensibilizar os participantes para o fato de que o passado e o futuro são realidades ilusórias, porque não existem de fato e são inacessíveis. Enfatiza a importância de estarmos inteiros diante da vida que se apresenta apenas no PRESENTE, toda vez que desapegamos da nostalgia do PASSADO e da ansiedade em relação ao FUTURO Conclui-se partilhando os sentimentos e impressões.
Por uma Eco-espiritualidade
A busca crescente por uma Eco-espiritualidade não é um fenômeno recente, novo, de cunho esotérico, que esteja na moda. É, sobretudo, um jeito de re-significar a Espiritualidade, tendo em vista os desafios por que passam a Vida e a Mãe terra, a Pacha Mamma dos povos nativos e andinos.
Há duas definições significativas para nos fazer entender o que vem a ser espiritualidade. Para S. S. Dalai Lama, a espiritualidade é tudo aquilo que produz no ser
humano uma mudança interior e o torna voltado para valores como compaixão, tolerância, capacidade de perdoar, contentamento – que gera felicidade para si e para os outros. Para Leonardo Boff, a espiritualidade é aconexão com a fonte originária de sentido pleno, espaço sagrado do Espírito, quese manifesta numa vida voltada para valores.Diferentemente do fenômeno religioso, particular, que insere o crente em um conjunto de práticas e credos, a espiritualidade é um fenômeno de abertura para a Vida, de reconhecimento da existência de uma dimensão de mistério, de encantamento diante das expressões de sacralidade da Vida. O prefixo“eco” vem do grego oikos, que significa casa e o conjunto de suas inter-relações.
Assim, a Eco-espiritualidade é um modo planetário que nos faz estar aserviço da Vida, que se revela no modo como habitamos as muitas casas e moradas humanas: o corpo, a família, a casa, o planeta. É a volta a estas moradas, cultivando um espírito de reverência e cuidado para com todas as relações. Segundo A Carta da Terra, Eco-espiritualidade é o reconhecimento de que todos os seres são interligados, formando uma mesma Comunidade de Vida, e cada forma de vida tem valor, independente do uso humano. VOCÊ SABIA?
Experiências que valem a pena compartilhar
Ainda que tenhamos manifestado o desejo de não crescer enquanto Informativo, os processos não nos pertencem. Esta semana, por conta do Informativo, tivemos contato com algumas experiências interessantes em Educação Ambiental. Tendo em vista a importância desta experiência social que, segundo Boaventura de Sousa Santos, vêm sendo desperdiçada mundialmente, optamos por trazer uma experiência a cada Informativo. O nascimento da Agrovida Nas montanhas dos arredores de Petrópolis (RJ) há uma Comunidade Rural chamada Bonfim, antiga sede de uma Fazenda, hoje área do Parque Nacional da Serra dos Órgãos, onde vivem muitas famílias de agricultores de hortaliças. Desde 1994, pelo Centro de Defesa dos Direitos Humanos de Petrópolis, acompanhamos aquela comunidade, sobretudo através de um trabalho com crianças, juventude e ecologia. Apesar das muitas tentativas de sensibilização para um trabalho voltado para a produção agroecológica, a agricultura local e familiar estruturou-se de forma convencional, com uso de agrotóxicos. Entre os jovens que acompanharam todas as fases do processo e da presença do CDDH, estava Fabiano, hoje já adulto, e educador na própria organização. Embora seus pais trabalhassem com agricultura convencional, Fabiano sempre manteve o interesse e a curiosidade por formas agroecológicas de plantio, sendo em vista o equilíbrio com a natureza. Depois de conhecer outras e novas experiências com agroecologia no Sul, com duas organizações parceiras – Centro Ecológico e Cetap – e depois de pesquisar de forma autodidata sobre os princípios da Permacultura, Fabiano conseguiu sensibilizar os seus pais para uma mudança na forma de plantio e cultivo. Há um ano e meio acompanhamos a família de Fabiano, nesta transição, subsidiados por um pequeno projeto por parceiros suíços, mediado pelo CDDH, para a construção de uma estufa e a compra de sementes. As plantações, em forma de Mandalas, anunciam a primeira colheita, neste momento, de vários tipos de alfaces, rúcula, agrião, repolho, cenoura, cheiro verde, manjericão, alecrim. É com muita alegria, celebrando a colheita próxima, que estamos formando o primeiro pequeno grupo de consumidores da Comunidade Agrovida. Ainda em processo de certificação formal, damos o aval inicial para a primeira colheita. A proposta é formar um grupo permanente, que irá receber uma cesta
semanal. Se você é de Petrópolis e tem desejo de fazer parte deste grupo, entre em contato conosco para fazermos o seu cadastro. Afinal, a forma como consumimos, e as relações diretas de fortalecimento dos empreendimentos pequenos e locais são maneiras concretas de inventar novos modos de vida. Parabéns coragem de mudar a forma de se relacionar com a vida!
Maristela Barenco Corrêa de Mello
Graduada em Teologia (ITF
Petrópolis), Psicologia (Universidade
Católica de Petrópolis), Mestre em
Educação (UERJ) e Doutora em Meio
Ambiente (UERJ). Formada em
Terapias Holísticas (ASBAMTHO).
Educadora social há 25 anos.
Fotografias
1) Produção agroecológica da
Agrovida (2011)
2) Escola nos arredores de Chennai,
Sul da Índia (2010)
3) Oficina da Carta da Terra para
Educadores em Torres, RS (2008)
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